Chamada para o dossiê temático "Reconfigurações do campo cinematográfico nos anos 2010"
O cinema entrou em seu segundo século de vida sob o signo da mudança radical, do transtorno, da reviravolta. Da produção à preservação, passando pela difusão e a projeção, bem como pela própria reflexão teórica, as novas tecnologias digitais vão se impondo progressivamente, provocando transformações intensas e duradouras que reconfiguraram o campo cinematográfico. Uma nova ecologia midiática engendrou e alimentou formas diversas de sensibilidade. Uma fissura se produziu no paradigma mais dominante, seja no que diz respeito à produção, ao consumo, à realização, à formação, aos agentes em cena, às estéticas e linguagens, aos protagonismos etc. Um novo vocabulário teórico e crítico, caminhos, hipóteses, redefinições e histórias se fizeram necessárias.
No caso específico brasileiro, com a consolidação de políticas públicas iniciadas na década anterior, em especial as implementadas pela Ancine, o cinema viveu momentos inéditos, não somente no que diz respeito aos números, mas, sobretudo, à diversidade geográfica de nossa produção e a uma participação nunca antes vista no país de variados grupos até então subrepresentados (com destaque para o cinema negro e indígena). Um cinema atravessado por inflexões de gênero, raça, classe social e orientação sexual, em articulações de continuidade e descontinuidade com a história do audiovisual feita e contada por aqui. Um cinema que desafiou, demandou e foi logo alimentado por curadores, críticos, professores e pesquisadores, em uma década igualmente marcante do ponto de vista da reflexão acadêmica e crítica. Em paralelo, a ascensão dos governos de direita e extrema direita estimulou um cenário de guerra cultural, com o desmonte das políticas culturais. O digital também trouxe inúmeros desafios para o mercado cinematográfico, com uma cada vez maior concentração de blockbusters nas salas de cinema, dominadas pelos multiplexes, e com as mudanças de hábitos de consumo em decorrência do crescimento das plataformas de streaming.
Essa edição especial e comemorativa dos dez anos da revista Rebeca visa à realização de um balanço crítico, enfrentando a dificuldade do curto distanciamento histórico, dedicado a explorar as reconfigurações do campo do cinema em sua última década, no Brasil e no mundo, em suas interações com a teoria, a política, a ideologia, a tecnologia, a estética, a circulação, o consumo e a recepção, entre outras dimensões. Convidamos autor@s interessados em examinar tendências estéticas, articulando continuidades e disjunções entre o primeiro e o segundo séculos do cinema; o impacto das tecnologias digitais nas mais variadas frentes; a emergência de novas formas de visualização de obras audiovisuais; uma certa revalorização do papel dos festivais e da figura do curador; a promoção e esboço de globalidades plurais e novas historiografias; referenciais e premissas teóricas e metodológicas diversas, preocupadas com a expansão do vernáculo cinematográfico, com a abertura de terrenos e campos de análise longamente negligenciados e ou com a devida reparação histórico-teórica de uma série variada de questões.
Dentre os variados temas que compreendem o escopo do dossiê, os editores reforçam o interesse por uma postura crítica-política de reavaliação e reconfiguração do campo, com maior ênfase em questões (mas não exclusivamente), como:
- Tendências e movimentos cinematográficos contemporâneos
- Tensionamentos sobre o cânone cinematográfico
- Novas histórias do cinema e de cinemas (new film history / new cinema history) e revisões historiográficas.
- Novas premissas teórico-metodológicas
- Cinemas feitos por grupos subrepresentados até então
- Cinemas decoloniais e pós-coloniais
- Crítica e curadoria
- Relações entre estética e tecnologia e o impacto do digital
- Políticas públicas, mercados cinematográficos, distribuição e cadeia produtiva
- Salas de cinema e novas formas de exibição, circulação e recepção
- Preservação audiovisual: políticas públicas e práticas de conservação e gestão dos acervos
As submissões devem ser feitas até o dia 05 de março de 2023. (Novo prazo 13/03/2023).
Editores: Daniela Giovana Siqueira (UFMS), Júlio Bezerra (UFMS), Luíza Alvim (UFRJ) e Marcelo Ikeda (UFC).