Chamada de Trabalhos - REBECA - Revista Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual 15
O cinema é uma arte e uma tecnologia do século passado, como tal necessita de uma profunda reavaliação.
A provocação acima chama a atenção para algumas das questões que permeiam muito do fazer e do pensar cinematográfico atual. Entre outras coisas, ela sugere uma desatualização da forma cinema frente a uma mudança de práticas visuais e sonoras e das maneiras como essas práticas se articulam no século XXI. A “morte” do formato cinematográfico clássico é tema recorrente e problemático entre teóricos e realizadores. Bellour, de forma tradicionalista, define a projeção em uma sala escura como “uma experiência única de percepção e de memória” (2012, p. 14). David Lynch, um pouco mais incisivo, afirma que “nem em um trilhão de anos” a experiência do filme poderá ser reproduzida em um celular (apud GAUDREAULT, 2013, p. 36).
Para muitos, a experiência do “cinema” está inescapavelmente ligada a um dispositivo bastante específico. Outros se permitem enxergar no atual cenário midiático diferentes condições de espectatorialidade, atreladas a novas telas e a novos alto-falantes: um “cinema de sugestões”, como diz Wasson (2007). Modos de ver e ouvir são construídos na articulação entre tecnologias, espaços e variados fenômenos sociais. Shaviro, por exemplo, afirma que “as tecnologias digitais, junto com as relações econômicas neoliberais, criaram modos radicalmente novos de fabricar e articular a experiência vivida” (2009, p. 2).
Apesar disso, a sala de cinema ainda é um elemento simbolicamente importante para a afirmação deste como prática artística, crítica e industrial. Recentes modelos de produção audiovisual, contudo, atravessam e desestabilizam determinadas relações cristalizadas ao longo de dois séculos da imagem em movimento. A popularização de dispositivos audiovisuais, sua conexão a redes cada vez mais rápidas, a configuração de novos hábitos de consumo de sons e imagens e, talvez mais importante, a reformulação de formas e códigos de expressão audiovisual historicamente cultivados, acenam com a possibilidade de outros tipos de cinema. A própria separação entre os campos do cinema e do audiovisual, fenômeno alimentado por práticas e interesses econômicos bastante disseminados, faz cada vez menos sentido. O vínculo a gigantescas e onipresentes bases de dados tem efeitos não apenas na forma como se produz e se organizam os elementos fílmicos, mas também interfere na constituição de repertórios culturais globais e locais. Nesse sentido, a separação entre indústria e produções pessoais é cada vez mais tênue. O equilíbrio entre a padronização da produção e do consumo de sons e imagens e a proposição de narrativas distintas acerca do mundo é um tema que precisa de maior investigação.
Pensar esse cenário “pós-cinematográfico” é possibilitar a emergência de novos objetos de pesquisa, originais e promissores, mas que ainda carecem de ferramentas mais apropriadas de análise. Não podemos dizer que alguns desses objetos seriam tão novos assim, mas eles nunca estiveram confortáveis quando tratados a partir das teorias clássicas do cinema. Videoclipes, jogos eletrônicos, videoinstalações, arte sonora ou arte digital de uma forma mais ampla são exemplos que, apesar de reconhecidos no campo artístico ou mercadológico, não se encaixam adequadamente em muitos dos modelos da investigação fílmica tradicional. Que falar então daquelas práticas mais recentes, amadoras, perdidas no labirinto informacional cotidiano? Mashups, autotune videos, musicless music videos, narrativas pessoais, fanfics, entre tantas outras, são formas de expressão que, apesar de uma suposta efemeridade, traduzem muito do espírito do nosso tempo.
Gostaríamos de convocar a todos para uma reflexão mais ampla sobre as diversas questões abertas no campo dos assim chamados “Pós-Cinemas”, discutindo suas implicações estéticas, culturais, sociais, políticas e econômicas. Alguns dos eixos sugeridos para a submissão de trabalhos são:
- Diálogos entre o cinema e as artes visuais, incluindo-se aí as novas configurações midiáticas, acervos de sons e imagens online e o redimensionamento das narrativas fílmicas;
- A popularização de tecnologias e a reapropriação de elementos da “linguagem” cinematográfica no âmbito de produções amadoras/não comerciais;
- O embate entre o local e o global na produção de imagens e sons. A possibilidade de autoconstrução e de reconhecimento de alteridades audiovisuais;
- Pós-cinemas e democracia. Pós-cinemas e direitos humanos. Pós-cinemas e diversidade. Como a diversificação e democratização de modos de fazer e de ver sons e imagens contribuem para esses temas;
- Por uma teoria “expandida do cinema”: como reavaliar os clássicos e como propor um novo horizonte para o pensamento cinematográfico.
Além do Dossiê, a revista tem outras quatro seções:
Artigos de Temáticas Livres, seção que reúne artigos de temática livre que não se incluam na temática do Dossiê adotada no número;
Entrevistas, seção que traz entrevistas com autores, pesquisadores, realizadores, roteiristas, artistas e personalidades da área;
Resenhas e Traduções, seção reservada à publicação de resenhas de livros e outras publicações da área, filmes ou filmografias, ampliando para obras audiovisuais de outros formatos como televisão, sites e/ou novas mídias e/ou eventos, além da tradução de artigo significativo já publicado, mas inédito no Brasil;
Fora de Quadro, seção voltada para a publicação de trabalhos com forma de expressão e formato livres.
As seções Dossiê, Temática Livre, Resenhas e Fora de Quadro aceitam submissão de trabalhos. Já nas seções Entrevistas e Resenhas e Traduções, tanto as entrevistas como as traduções serão realizadas a critério dos editores de REBECA.
Convidamos a todos que participem de nossa revista enviando artigos, opiniões e reflexões e agradecemos a participação.